Kátia Stocco Smole
Diretora do Grupo Mathema
No livro Avaliação e Educação Matemática, Paulo Abrantes traz novos pontos sobre um tema muito questionado por educadores: a avaliação.
Ao refletirmos sobre essas e outras questões, foi possível perceber claramente que a concepção de avaliação como medida está diretamente relacionada a ideia de que o conhecimento é dado por transmissão. Nesta lógica, o aluno é visto como um balde vazio, que deve ser preenchido com conhecimento. Para avaliá-lo, faz sentido que o principal instrumento seja uma prova, que ocorre ao final de um tempo. Ferramenta única, individual e sem consulta, ela vale pelo tempo de “matéria dada” e, para avançar, é preciso que haja muito conteúdo. . O comportamento, neste caso, é apenas observado, sendo o fracasso atribuído geralmente ao aluno: desinteresse, falta de pré-requisito, falta de dom, não tem inteligência suficiente etc.
Embora a avaliação como distância, ou por objetivos, pareça inicialmente uma alternativa à concepção anterior, ela tem na essência a medição. É um concepção tecnicista, que traz o diagnóstico como forma de medir objetivos os alunos alcançaram. Trata-se de uma prova organizada por objetivos, aspecto que deixa claro que o intuito é avaliar um conhecimento encadeado, linear, onde cada objetivo é pré-requisito para outro mais complexo.Quando o aluno não se sai bem, falsas soluções ou remediações são procuradas para solucionar as falhas: mais exercícios relacionados aos objetivos não atingidos, recuperação paralela, outra chance de prova etc.
Ambas concepções de avaliação apresentam uma tendência à cultura da homogeneização: provas iguais, baseadas em exercícios parecidos com aqueles realizados antes da prova. O processo seletivo é evidente, abrindo espaço para classificar os alunos segundo seu desempenho em provas. Embora nas provas haja uma tendência em avaliar objetivos observáveis, no parecer final (nota bimestral) intervêm outros aspectos que fazem parte de um currículo não explícito: comportamento, habilidades que o aluno não tenha e que o professor deseja etc. Nas concepções da medida e da distância, o currículo se organiza como um mosaico de disciplinas justapostas. A cultura validada é a dos conteúdos da matéria e não há um olhar para o sujeito.
O planejamento é o lugar de onde são tirados os objetivos a serem avaliados e um programa de ensino sobre o qual a avaliação não tem nenhum acesso ou interferência.Quando pensamos em uma escola que se preocupa em articular ensino e aprendizagem, que olha o sujeito, “conversa” com sua cultura, que tem os objetivos como um mapa do processo, a medida não avalia e, por isso, a classificação não faz sentido.Seria preciso que a avaliação servisse como bússola de trajeto para interpretar o mapa e fazer alterações no caminho, quando necessário. A prova já não tem tanta importância e não reina absoluta em um processo que exige olhar constante, atento e investigador.
Para que essa avaliação ocorra é preciso que saibamos que o conhecimento é dado por relações entre significados e que os alunos não podem ser “medidos” na avaliação, uma vez que são diferentes, possuem múltiplas competências e formas de aprender. Longa caminhada para tal mudança de concepções. Longa caminhada para responder questões sobre avaliação e alterar a cultura da escola em relação a ela.
Referências bibliográficas
Abrantes, Paulo. Avaliação e Educação Matemática. Volume I, MEM/USU- GEPEM, 1995.
Perrenoud, Philippe. Avaliação: da Excelência à Regulação das Aprendizagens – Entre Duas Lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1999.
Smole, Kátia C. S. Inteligência e Avaliação:da Idéia de Medida à Idéia de Projeto. Tese de doutoramento em educação – Area de Ensino de Ciências e Matemática. Apresentada á FEUSP em maio de 2001.