O PORTFÓLIO E O COMPROMISSO DO ALUNO COM SUA APRENDIZAGEM

Kátia Stocco Smole

Diretora do Mathema

Não nos é estranha a afirmação de que os alunos não têm compromisso com a própria aprendizagem. Todas as pessoas que de algum modo já passaram pela escola, seja como professor, coordenador, pais e mesmo como alunos, já ouviram essa afirmação. Há algum tempo temos pensado a respeito e tentado entender por que, em um certo sentido, a afirmação sobre o descompromisso com a aprendizagem não é de todo equivocada. Ainda que não possamos generalizar, não é difícil perceber que muitos alunos recebem passivamente as avaliações e seus resultados, ou que ficam à espera de que alguém os ajude com suas dificuldades. Raramente vemos um aluno que, sem a iniciativa alheia, planeja, discute, questiona a própria avaliação. Fácil seria constatarmos que estamos diante de uma geração de alunos descompromissados, desinteressados, apáticos, sem vontade, que nem ao menos sabe porque está na escola.

Mas será mesmo isso? Devemos aceitarr justificativa tão simples para o descaso do aluno? Nada teria a escola com esse comportamento? Poderíamos achar que geneticamente os alunos de toda uma geração ficaram marcados, nasceram sem o gene do compromisso com a própria aprendizagem?

Acreditamos que não é bem assim. Os alunos aprendem o desinteresse na escola, em pequenas e freqüentes ações que a instituição faz. Tomemos como exemplo o professor que,, após avaliar o aluno e obter resultados ruins, comenta os problemas e reclama dos defeitos, não com o aluno, mas com pais e outros professores.O estudanteo é o último a saber sobre ele mesmo. Desde a educação infantil será tutorado, protegido, poupado, desinformado de como e por que a aprendizagem é sua responsabilidade. A longo prazo, como esperar, então, um comportamento comprometido? Seria outra questão de genética? Compromisso é inato ou aprendido?

Em nossa opinião, não se é comprometido, se está comprometido com aquilo que nos pertence, que nos interessa, pelo que desejamos zelar. Neste sentido, se desejamos que o aluno seja tutor de sua aprendizagem, devemos partilhar com ele a responsabilidade por sua avaliação desde cedo.Uma forma de fazer isso é escolher instrumentos de avaliação que ensinem o aluno a ver e reconhecer-se no processo de ensino e aprendizagem, percebendo os próprios avanços, necessidades, aprendizagens e dúvidas. Para que isto seja feito, um instrumento de avaliação importante é o portfólio.

O princípio primeiro da organização de um portfólio é que ele esteja inserido em um contexto de avaliação no qual os instrumentos sejam utilizados para que os alunos percebam suas conquistas e avanços, valorizando uma variedade de estilos de aprendizagem. O conhecimento deve ser visto como algo que requer cuidado, empenho e um processo de investigação e documentação.

O portfólio tem como finalidade proporcionar aos envolvidos no processo avaliativo uma visão ampliada sobre o processo de trabalho em aula, proporcionando meios para alunos e professores dialogarem sobre a aprendizagem e o desenvolvimento de cada um. Tal aspecto encoraja os alunos a comunicarem as próprias compreensões e dúvidas de maneira cada vez mais proficiente.

Em nossa forma de pensar, o portfólio é uma testemunha da ação pedagógica, registro de um trabalho que ocorreu e memória de uma mesma proposta desenvolvida em diferentes momentos. A documentação do ensino e da aprendizagem envolve trocas das dimensões pedagógica e psicológica do processo de ensino e aprendizagem. Pedagógica, pois o portfólio surge como um instrumento fundamental do ensino e da aprendizagem, valorizando a reflexão e a ação do aluno. Psicológica porque mostra um pouco da personalidade de cada um, sua forma de ser e de pensar. Por meio dos registros, o professor pode compreender alguns anseios, dificuldades e conquistas de cada um.

Por envolver essas duas dimensões, o portfólio constitui importante elemento de comunicação entre aluno e professor, entre educadores e pais, entre alunos e pais, funcionando ao mesmo tempo como regulação do processo educativo e como instrumento de avaliação eficiente, uma vez que propicia uma análise contínua dos progressos individuais dos alunos. É exatamente nessa confluência comunicativa que o portfólio pode contribuir para levar o aluno reconhecer-se na ação de aprender, sendo responsável por ela.